quarta-feira, 25 de maio de 2011

O homem do baixo na banda do Dragão.

  O futebol, como às vezes a vida, vive de metáforas. Ou então, simplesmente, somos nós que gostamos exageradamente delas. Simplificam algumas coisas e tornam outras mais aturáveis. De uma forma ou outra, a verdade é que andava há anos em busca de uma metáfora para o futebol de João Moutinho.

  Já sabemos que é a formiguinha do meio-campo que trabalha enquanto as cigarras cantam. Também cabe no lugar-comum do operário que arregaça as mangas mas sabe vestir com elegância um fato de gala. Pode ser o pêndulo ou o relógio que bate as horas certas da equipa. Tudo resumido, é um factor de equilíbrio,. Isso parece consensual, ainda que a Europa lhe vire os olhos ou haja quem só tenha reparado nele a sério quando se transferiu para o FC Porto por alguns milhões. Ou desde que é titular indiscutível da selecção, o que dá a mesma coisa em termos de balizas temporais.

  Ontem fui ver os The National ao Campo Pequeno. Eu e mais uns milhares de pessoas, claro. Acho que fizemos todos muito bem. Entre o calor asfixiante destas noites esquizofrénicas de Maio, armadas ao pingarelho com a mania que são de meses mais adiantados, percebi o que verdadeiramente acho, há muito tempo, do futebol de Moutinho: ele é o baixista das equipas em que joga.

  Os The National começam grande parte das músicas numa espécie de suspensão. Há guitarras, sempre, sopros que vão ganhando fôlego com o andar dos minutos, uma bateria mais feita de pratos que de bombos. A cantiga vive suspensa, lá está: aguarda-se a qualquer momento o desencadear de fenómenos que a façam fluir livremente. À partida é um papel que esperamos do baterista. Quando ele soltar pés e mãos é altura de rodopiar. Mas não. Nos The National, como na generalidade das bandas, é o baixo que comanda ritmos e intensidades.

  Dá-se-lhe muito menos importância do que na realidade tem porque há guitarras, baterias, trompete, teclas, todo um conjunto de cigarras que cantam mais alto. E a voz, claro. Falcao, por exemplo, é o vocalista do FC Porto. Hulk é um óptimo baterista, que também faz coro nas vozes e até toca a guitarra com Helton, se for preciso. É nos solos de bateria, contudo, que se dá inevitavelmente por ele.

 Moutinho é baixista. Está ao leme e define os compassos. Dá maior ou menor intensidade ao jogo do multicampeão. De quando em vez também ele arrisca um solo - momentos raros em que toda a metáfora fica mais clara. Mas na maior parte do tempo lá está ele num canto do palco, concentrado nas quatro cordas que são a base da melodia inteira. Ciente da sua importância e da forma como permite o brilho dos companheiros.

  Felizmente Paulo Bento é seleccionador nacional e já o tinha treinado no Sporting. Em semana de selecção, é bom saber que o baixista português será João Moutinho.

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