A fábula do gigante. Mágica, enternecedora, conciliadora de desejos e
aspirações ao altar europeu. O gigante esmaga, o
gigante arrasta e marca. Impressiona pela
inteligência, diligencia com urgência, rodeia-se de uma plêiade sabedora
e de confiança:
João Moutinho, o gigante, faz deste F.C. Porto
cada vez mais maior.
O golo, prémio justo ao autor, sabe a pouco.
A diferença entre dragões e andaluzes foi bem
superior a esse detalhe. No Dragão, os dois mundos raramente se tocaram.
O Porto
é maior, é melhor, tem a obrigação de se fazer
ouvir no La Rosaleda e seguir em frente.
Sem ser oficial, o
documento
é reconhecido por todos. Neste relvado, os
resultados indicam que o predador é o que lá vive e as presas são o que o
visitam.
É a lei dura de uma selva azul e branca e
raramente a lógica deixa de prevalecer.
Neste jogo de Champions, o
quarto
classificado da liga espanhola não foi exceção.
Entregou-se ao papel de expetativa assustada, de ambição triturada pela
posse
de bola, de dúvida perturbada perante uma
gentileza que enleia e engana.
Helton teve noite descansada, tão poucas foram as bolas
que lhe chegaram. O Porto foi ditador em terreno
minado, fez uma pressão alta asfixiante e justificava, insistimos,
muito
mais do que um mero golo.
Esse chegou,
já com atraso, aos 56 minutos. Nasceu no génio de um Alex Sandro
impressionante
(aguentou duas cargas antes de cruzar) e morreu
na baliza do Málaga, empurrado com altivez e cavalheirismo pelo gigante
de
nome Moutinho.
Os espanhóis pediram fora-de-jogo. Com razão. No estádio foi impossível atestar a veracidade dos
protestos, mas a televisão anulou a dúvida. Justiça poética?
Voltemos a Moutinho. O que jogou, o que fez jogar, o
que debruou na noite do Dragão é world class. João Moutinho já é um dos melhores médios do mundo, um honoris causa
na arte do passe, da visão, do futebol cerebral.
Toda a consciência mágica do F.C. Porto esteve armazenada no cérebro
deste gigante, mas outros houve em grande plano.
Alex Sandro, já o referimos, Fernando, Jackson, Otamendi.
Este
Porto cresceu bem. Descobriu a segurança do
futebol horizontal, a coragem da verticalidade e observa como poucos a
relevância
da circulação de bola. É como se o sangue do seu
organismo circulasse também nesse ciclo que atrai e encanta.
Pena
é, lá está, que tamanha superioridade não
permita ir totalmente tranquilo a Málaga. Apesar de rebaixado ao
estatuto de figurante
sorridente, o emblema espanhol sai vivo da
refrega e a acreditar que é possível fugir à eliminação.
Izmaylov
esteve
a centímetros de marcar, Fernando escorregou
quando podia ter feito golo. Duas ocasiões mais numa noite controlada
durante
90 minutos pelos bicampeões de Portugal.
O
futebol dispensa certezas e foge de título feitos à pressa. Os
sintomas,
porém, apontam num sentido claro: há Porto, há
Champions, há um gigante mandão a querer aparecer na Europa.
Esta
fábula merece mais capítulos na Liga dos Campeões.